O assassinato do casal Sundermann, em São Carlos, interior de São Paulo, há 29 anos, continua sendo o único crime não desvendado na cidade.
Tratou-se de um assassinato que eliminou brutalmente, em sua casa, no dia 12 de junho de 1994, o casal José Luiz Sundermann e Rosa Hernandes Sundermann, ambos militantes do movimento político e sindical de São Carlos e região.
Até hoje o Estado brasileiro – representado pela polícia e pela Justiça – não apontaram nenhum suspeito(os) pelo crime. Uma impunidade comum aos assassinatos de lutadores sociais no Brasil.
Zé Luís e Rosa eram figuras de imenso reconhecimento nas lutas e organização dos trabalhadores(as) de toda região de São Carlos. Rosa era da direção nacional do PSTU e Zé Luiz, também militante do PSTU e vice-presidente do SINTUFSCar (Sindicato dos Trabalhadores da Universidade Federal de São Carlos).
A luta de Rosa e Zé Luiz extrapolava os muros da universidade
Em 1993, um ano antes dos assassinatos, ambos foram dirigentes de uma forte greve dos trabalhadores rurais da Usina Ipiranga (Usina de Açúcar e Álcool, localizada no município de Descalvado). Muitos “boias-frias”, que trabalhavam no corte manual da cana-de-açúcar, moravam na periferia de São Carlos e foram até a sede do SINTUFSCar, dentro da UFSCar, pedir apoio a sua greve.
Foram 15 dias de greve que entraram na história da cidade e da região. Foram dezenas de assembleias, passeatas, ocupação de agência bancária para receber a quinzena, e muita repressão. A PM sempre muito truculenta, ameaças veladas e explícitas a Zé Luiz e Rosa. Um PM chegou a dar um tiro contra o piquete em frente à entrada principal da UFSCar. Mas a greve mobilizou um amplo apoio popular, diante das péssimas condições de trabalho a que eram submetidos.
A Greve foi vitoriosa, e a usina ainda teve que pagar multa por sequer fornecer EPIs (equipamento de proteção individual) aos trabalhadores. A greve revelou que em São Carlos, tida como um polo tecnológico com duas Universidades de ponta (USP e UFSCar) convivia com situação análoga a escravidão, com trabalhadores contratados por “gatos”, salários muito baixos, trabalho exaustivo e muitos moravam em casa fornecida pelo “gato” e comprava na caderneta destes mesmos atravessadores.
Na véspera da campanha salarial dos trabalhadores rurais de 1994, Zé Luiz e Rosa foram assassinados. Estes fatos sempre suscitaram a ideia de que foram mortos em condições que deixaram claro se tratar de uma execução ligada às lutas do campo. Apesar das evidências, essa nunca foi uma linha investigativa.
O crime foi denunciado em organismos internacionais como na Corte Internacional da Organização dos Estados Americanos – OEA – e o Brasil chegou a ser condenado, mas apesar disso, 29 anos depois, esse crime continua impune.
Um País que carrega na sua história a marca da impunidade
Casal Sunderman, Marielle Franco, Anderson Gomes, Dom Phillips e Bruno Pereira, Yanomanis e indigenas e inúmeras vítimas de campo e da cidade.
O assassinato do casal Sunderman não é um fato isolado no histórico de execuções de lideranças políticas no país. Sob o governo Bolsonaro, os conflitos no campo resultam em um número cada vez maior nas tentativas de assassinato e de ameaças de morte. Em grande parte, as pessoas assassinadas no ano de 2019, primeiro ano do governo Bolsonaro, eram de lideranças de movimentos dos trabalhadores rurais e indígenas, que lutavam pelo direito ao uso da terra e que realizavam denúncias de grilagem, de extração ilegal de madeira, de invasão de garimpeiros.
O principal foco dos ataques são os territórios tradicionais, seja para a exploração de madeira, minério, expansão agrícola de fazendas, agronegócio ou especulação imobiliária.
Somando-se a isso o país ainda vive a vergonha da não elucidação do assassinato de Marielle Franco e de Anderson Gomes, seu motorista, em março de 2018. Fica muito evidente que a relação do assassinato da vereadora está diretamente ligada aos grupos de milicianos. O principal suspeito, Ronnie Lessa, morava nada mais, nada menos, que no mesmo condomínio que Jair Bolsonaro. Essa coincidência não é mero acaso.
Voltando aos assassinatos no campo, o mundo acompanhou, estarrecido, o desaparecimento do jornalista britânico Dom Phillips e do indigenista brasileiro Bruno Pereira que foram executados por suas lutas em defesa dos povos originários e contra a exploração ilegal de garimpo e extração de madeira e minérios.
A CPI sobre o MST é uma parte dessa luta para criminalizar os movimentos sociais. Quando não matam diretamente, atacam de forma violenta quem luta.
Basta de assassinatos, de destruição ambiental, grilagem e violência no campo. É preciso pôr fim a essa situação que vivenciamos no país e exigir investigações sérias e punição exemplar para os assassinos e mandantes dos homicídios de todas as lideranças de trabalhadores e dos povos indígenas que seguem sendo massacrados sob a luz da impunidade.
O legado de Zé Luís e Rosa seguem pulsando nos trabalhadores e na juventude! 29 anos se passaram, mas Zé Luís e Rosa jamais serão esquecidos!
Zé Luís e Rosa Sundermann, PRESENTES!
Fonte: SINTUFSCar